Nós, povos originários do Nordeste e de lugares onde ocorreu o processo colonial há mais tempo, carecemos primeiro que todos reconheçam que somos indígenas. Quando se fala que existe indígena no Nordeste, muitos dizem que “no Nordeste não existem mais indígenas, porque as invasões que aconteceram há 524 anos exterminaram os indígenas, que foram todos mortos” etc. Parem com essa visão!
Como diz o grande líder Chicão Xukuru, “massacrados sim, exterminados não!”. Nós fomos massacrados, nós fomos presos, mortos, genocidados, estuprados, mas nós resistimos e re-existimos. As pessoas podem ter certeza e convicção de que uma das páginas mais belas de re-existência e resistência ocorreu entre os indígenas nordestinos e de todas as áreas de ocupações antigas. Sofremos preconceito e racismo grande, porque sempre vem alguém dizer que “os indígenas do Nordeste não existem mais, se miscigenaram, se misturaram”. Eu digo: “nós existimos sim, e temos o direito ao nosso território”. E digo mais, é uma resistência forte e bela porque quando um indígena do Nordeste, que é a antiga frente de invasão, se levanta, nós fortalecemos a luta de todos os indígenas do Brasil inteiro.
Gostaria de falar aqui dos parentes Guarani Kaiowá, do Mato Grosso do Sul, que sofrem um dos maiores massacres, quase cotidiano. Tem indígenas de lá presos nesse país. Assim como no Nordeste, do sul da Bahia onde está o povo Tupinambá, sofremos humilhações, massacres, mortes, tentam a todo momento não reconhecer nossa indianidade e nosso direito à terra, isso também acontece lá no Mato Grosso do Sul com os Guarani Kaiowá. Então, a luta do indígena nordestino é a luta da existência e re-existência.
Muitas pessoas me perguntam: “Casé, eu não consigo enxergar a cultura indígena na minha cultura e na formação sociocultural brasileira”. Eu digo: “Você não consegue enxergar porque não é pra você enxergar. É para nos inviabilizar, é pra nos silenciar.” Nós, indígenas nordestinos estamos presentes na forma de falar, na forma de comer, nas festas juninas (que eu sempre digo que é uma festa acima de tudo indígena), na forma de ouvir música, de dançar, de dialogar. Muita gente fala: “Eu tenho uma avó pega a laço ou por cachorro”. Eu digo: “Essa sua avó, sua bisavó, é aquela indígena do Nordeste ou de outras faixas de ocupação antiga, que foi retirada da aldeia e foi por vezes violentada. A resistência dos povos indígenas nordestinos é uma das mais belas e mais fortes resistências que existem neste país.