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Os desafios das universidades públicas no novo governo

Comunidade acadêmica está esperançosa e atenta com o atual cenário político

Por Izabella Bontempo

Comunidade acadêmica está esperançosa e atenta com o atual cenário político

Fachada de um prédio longo

”Desde o início do governo Bolsonaro a política de educação foi negligenciada, tratada como instrumento para a guerra cultural e com aparelhamento ideológico. Trocas de ministros, denúncias de corrupção, crises na oferta dos serviços públicos foram a tônica”. É com esse trecho que se inicia o capítulo sobre educação do relatório final do gabinete de transição do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Entregue em dezembro de 2022, o documento apontaria os desafios e rumos do novo governo.

Na comunidade acadêmica, as perspectivas para a educação no governo Lula são positivas, segundo o vice-reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA). “No dia 19 de janeiro o presidente fez uma reunião com todos os reitores das universidades, coisa que os últimos dois presidentes não tinham feito. O evento reabriu o diálogo democrático com as instituições de ensino, não só do ponto de vista do atendimento das reivindicações, mas na discussão do papel das universidades no projeto de desenvolvimento social, econômico, ambiental e cultural do país”, falou Penildon Silva Filho.

Já no segundo mês de governo houve um reajuste das bolsas da Capes e CNPq, além de um aumento na quantidade de financiamento para pesquisas de mestrado e doutorado. Uma medida mais recente, de abril, anunciava a liberação de R$ 2,44 bilhões para recompor o orçamento das universidades e institutos federais de educação.

Para Analise da Silva, 1ª vice-presidenta do APUBH, Sindicato dos Professores de Universidades Federais de Belo Horizonte, Montes Claros (UFMG) e Ouro Branco, não há novidade. “Não precisamos inventar a roda, ela já existe e é fácil identificar. Ela é o que os setores conservadores e o campo reacionário vêm buscando destruir: a Constituição de 1988 e todos os seus direitos derivados”, diz.  

Desde 2016, com o impeachment da então presidenta Dilma Rousseff, a educação vem sofrendo retrocessos em termos de políticas públicas. Os governos Temer e Bolsonaro trouxeram sucateamento, corte de verbas e implementação de projetos de privatização da educação pública brasileira do ensino básico ao ensino superior. Dentre as medidas polêmicas estão a implementação da Emenda Constitucional 95, o “Teto de Gastos”, os ataques às políticas de cotas e a aplicação do Novo Ensino Médio.

“Suspiro” é como define Arlindo Pereira, Coordenador Geral do DCE da UFBA e militante do Levante Popular da Juventude, o momento nas universidades. Ele acredita que haverá maior possibilidade de participação dos envolvidos.

Movimentos estudantis avaliam que o novo governo terá um papel fundamental na reconstrução da educação pública no país. Larice Ribeiro, militante do Levante Popular da Juventude, presidenta do Diretório Central de Estudantes (DCE) da UESB, e vice-presidenta da União dos Estudantes da Bahia (UEB), afirma que não tem como dar continuidade nas políticas públicas de educação elaboradas no governo Dilma porque, desde então, foram destruídas e distorcidas as propostas originais. “Precisaremos reconstruir a proposta do ensino técnico, voltar a investir nas universidades públicas, principalmente nos campos da ciência e tecnologia, implementar novas políticas de permanência estudantil e revogar as nomeações dos reitores interventores das universidades públicas instituídas pelo antigo governo” afirma.

Para ela, a prioridade das universidades públicas nos próximos anos será quebrar a política de alianças da frente ampla. “Nosso desafio agora é um processo de mobilização permanente para não permitir que a agenda liberal paute a educação. Não vamos permitir que o setor empresarial destrua o sonhos de trabalhadores e trabalhadoras, de estudantes e da juventude de ingressar e permanecer em uma universidade pública”,  afirma.

Penildon Silva defende que daqui para frente será preciso completar o processo de expansão das universidades que foi iniciado com o Reuni (Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais) e interrompido em 2016. “Muitas unidades de ensino precisam terminar as obras, outras precisam iniciar, a UFBA mesmo tem alguns institutos que ainda não têm sede própria, afirmou.

Evasão estudantil

Para o vice-reitor da UFBA, as principais pautas da educação são a fonte de financiamento especifica para a extensão universitária e a garantia da permanência do estudante na universidade, o que implica no investimento em assistência estudantil. “A evasão está grande depois da pandemia, da crise econômica, e não adianta abrir novas vagas ou construir mais universidades se a gente permite e entrada e depois não consegue garantir a permanência dos alunos. O nível de evasão chega a 50% em alguns casos” aponta.

Analise explica que para compreender melhor o problema e buscar soluções mais adequadas, é preciso, primeiro, entender a diferença entre os conceitos de abandono e evasão escolar, pois apesar de serem usados como sinônimos, eles especificam situações diferentes em que as pessoas estudantes deixam a escola.

“Deixar de frequentar as aulas durante o ano letivo caracteriza o abandono escolar. Já a situação em que o estudante, seja reprovado ou aprovado, não efetua a matrícula para dar continuidade aos estudos no ano seguinte é entendida como evasão escolar”, explica.  Para ela, “entender a razão que leva uma pessoa graduanda a estar fora da universidade é essencial para se chegar a um diagnóstico e, consequentemente, conseguir criar soluções para amenizar este cenário”.

Larice aponta que esse é um dos temas mais preocupantes no movimento estudantil. “A pandemia escancarou a situação socioeconômica dos nossos estudantes, e muitos deles deixaram as universidades porque não tinham condições básicas pra frequentar as aulas, como o dinheiro do transporte ou da alimentação”, aponta.

Segundo os dados da Secretaria de Modalidades Especializadas de Educação (Semesp), instituto que representa as mantenedoras de ensino superior no Brasil, em 2021, a taxa de evasão chegou aos 36,6% nas modalidades de ensino a distância (EaD) e presencial. O resultado foi pior só em 2020, quando 3,78 milhões de pessoas graduadas largaram seus cursos.

A vice-presidenta da APUBH analisa que os estudantes que evadiram de seus cursos são, em sua maioria, aqueles em condição de maior vulnerabilidade social, portanto, negros, pobres e periféricos. “Uma pessoa estudante longe do sistema de ensino é um problema que vai muito além da questão escolar: se torna uma questão social”, afirma.

Orçamento público

A recomposição do orçamento para as Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) está dentre os principais tópicos levantados pela comunidade acadêmica. Penildon Silva comemora o fato das universidades integrarem as excessões do teto de gastos. “Isso é fundamental porque garante que elas recebam grandes investimentos e poderão ser grandes instituições que estejam ao lado da sociedade para poder garantir a soberania brasileira” finaliza.

Para Arlindo, a recomposição orçamentária é muito importante mas ainda é insuficiente, porque, para além da estruturação física nas universidades, é preciso ter uma implementação do orçamento do Plano Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes).  “Precisamos transformar o Pnae em lei e, pra isso, precisamos de uma recomposição orçamentaria”, defende. “Temos muito trabalho pela frente!”, finaliza.

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