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Sair ou disputar? Oito ativistas discutem estratégias e analisam o avanço da extrema-direita nas redes sociais

As redes sociais têm se tornado um espaço cada vez mais hostil aos direitos humanos, à democracia e à saúde mental. O que ativistas e comunicadores populares podemo fazer? Sair ou ficar? Trouxemos oito vezes diversas para debater esse tema.

Nirvana Lima, Sérgio Amadeu, Adriano Liziero, Ana Mielke, Raimundo Quilombola, Pedro Telles, Vitória Rodrigues e Joelson Maworno opinam sobre essa encruzilhada digital. 

Foto: Reprodução

O ano de 2025 começou com o anúncio de Mark Zuckerberg, fundador do Facebook e criador da Meta, que também administra o Instagram e Whatsapp, do fim da checagem de fatos e se alinhando com as políticas digitais de “livre expressão” da extrema-direita. O antigo Twitter, atual X, cujo atual dono é Elon Musk, um dos homens mais ricos do mundo e parte do governo de Trump, se tornou um espaço de propaganda e fermentação de ideias retrógradas. Cada vez mais, as redes sociais são espaços onde pessoas, grupos e comunidades podem ser atacados com base em uma “liberdade de expressão absoluta”. 

Há tempos em que esses espaços são criticados pela mineração de dados privados, por algoritmos viciantes, pela falta de moderação de conteúdo e por abrirem espaço para discursos de ódio. Seus efeitos também são sentidos em diversos adoecimentos psíquicos amplificados por essas dinâmicas. Críticos apontam para seu caráter massificador, alienante e voltado ao consumismo desenfreado.

Fomos ouvir especialistas e ativistas da área da tecnologia para entender como essas movimentações podem afetar a sociedade dentro e fora do ambiente digital e quais riscos elas representam para a democracia. Enquanto alguns defendem que ocupar esses espaços é essencial para enfrentar a desinformação, o neofacismo, os discursos de ódio e ataques à democracia, outros alertam para o risco de legitimar e fortalecer essas redes. O dilema evidencia os desafios da comunicação no momento em que a luta por visibilidade deixa pessoas em territórios que funcionam como verdadeiros ecossistemas de manipulação e radicalização. 

Sair das Big Techs como forma de protesto já é uma realidade. Ativistas em Londres fazem uma campanha contra a rede X. A mensagem “Delete sua conta do X“ foi espalhada pela cidade acompanhada da imagem de Elon Musk fazendo um gesto nazista. As mensagens criticam a postura do bilionário pela falta de moderação e permissão para discursos de ódio. 

Há também quem prefira deixar as plataformas e migrar para ambientes digitais mais seguros e descentralizados, que priorizam a segurança psicológica e a privacidade dos usuários, a exemplo do Mastodon, Pixelfed e Friendica, são algumas das mais usadas.

“Delete sua conta: se um bar deixa nazistas entrarem, é um bar nazista”, diz o cartaz.

A Escola de Ativismo ouviu oito vozes de diferentes territórios e experiências no ativismo digital. Elas falam sobre os desafios de se comunicar em plataformas controladas por bilionários, os riscos para quem defende direitos humanos e os caminhos possíveis para manter a luta viva.

Perguntamos se faz sentido continuar nas plataformas de Elon Musk e Mark Zuckerberg ou se é mais estratégico buscar outras redes com as mesmas funcionalidades e layouts semelhantes. Também indagamos se há métodos e estratégias de proteção online e as formas de fazer com que essa navegação seja mais saudável e segura para ativistas que usam as redes sociais em mobilizações e pressões por mudanças sociais. Veja as respostas.

Sérgio Amadeu da Silveira – Doutor em ciência política, professor da UFABC, criador e apresentador do podcast Tecnopolítica

O único sentido de continuar atuando nas plataformas das Big Techs está em combater o discurso da extrema direita e não permitir que ele se amplie sem contraposição. Como essas plataformas concentram atualmente a maioria das verbas publicitárias do país, elas conseguem atrair as pessoas que buscam entretenimento e relacionamentos cotidianos. A ampla maioria das pessoas só se interessam pela política em poucos momentos. Não podemos deixá-las apenas ouvir ou receber o discurso das forças reacionárias. Segundo a pesquisa sobre o uso da internet no Brasil em 2024, realizada pelo Comitê Gestor da Internet, 81% das pessoas com mais de 10 anos utilizam redes sociais online no país. Sem dúvida, não devemos ter ilusão alguma que os donos das redes controladas pelo Grupo Meta, pelo Alphabet e outras redes ligadas ao Vale do Silício atuarão para beneficiar as forças da extrema-direita no Brasil. 

Essas redes nunca foram neutras, nunca foram defensoras das liberdades democráticas, muito menos da nossa Constituição. Atuam em diversos países, incluindo o Brasil, em consonância com parlamentares reacionários para impedir a regulamentação democrática de suas operações. Não aceitam a transparência algorítmica, não querem se submeter à vontade das maiorias, não aceitam bloquear conteúdos negacionistas, racistas, misóginos, pois as narrativas exageradas, agressivas, principalmente espetaculares dão maior visualização e permitem que as pessoas fiquem mais tempo nas plataformas. Isso permite que os seus sistemas algorítmicos coletam mais dados de cada usuário e aprimore os perfis de cada pessoa colocando-as em amostras que são vendida para a publicidade e para a venda de serviços. Espetacularização e monetização são os princípios que guiam os algoritmos das redes de relacionamento das Big Techs.

Precisamos desincentivar o uso dessas plataformas. Mas, devemos encontrar alternativas. Temos condições tecnológicas de superar os dispositivos tecnológicos e as arquiteturas autoritárias e restritivas das redes de relacionamento. Para isso, precisamos de construirmos novos arranjos que devem partir da cultura. Nosso problema para montar alternativas às Big Techs não está na falta de conhecimento técnico, mas na falta de um projeto de futuro que enfrente o sistema capitalista perverso e desigual. Precisamos reunir a força cultural da nossa sociedade em projetos tecnoculturais. Podemos apostar na tecnodiversidade. Sem isso, não atrairemos recursos para desbancar o poder descomunal das Big Techs. Temos que lutar pela hegemonia cultural e por um mundo em que os jovens tenham futuro. A extrema direita oferece como futuro, o fundamentalismo religioso e a volta a um passado de violência de controle absoluto dos corpos pelos coronéis do patriarcado, a submissão das meninas e mulheres, a colonização do espaço para devastar ambientalmente novos mundos. É a reprodução do velho colonialismo racista e violento em tempo do playboy Elon Musk. Assim, nossa estratégia deve ser dupla. Utilizar pragmaticamente as redes sociais das Big Techs para conter o avanço do neofascismo e apostar principalmente em novas plataformas federadas, coletivas e que superem o vigilantismo imposto pelo capitalismo de dados.

Não devemos apostar em fazer o mesmo que as Big Techs fazem. Imitando fascistas nos tornamos iguais a eles. A estética das Big Techs apostam em um mundo somente individualista, cínico, concentrador. Temos que aprender com os povos originários, temos que criar novos arranjos, extrair do senso comum a sua criatividade não-conservadora e apostar uma recombinação dialética que teste novas possibilidades de interação e comunicação. Fazer redes sociais que se baseiem em cliques como critério de verdade, em sensacionalismos, em espetacularização não nos tornará diferentes. 

O fato de andarmos o tempo todo com celulares nos coloca o tempo todo à disposição das Big Techs. Essas corporações exploram gatilhos emocionais que chamamos de gatilhos de atenção. O objetivo dessas empresas é nos tornar viciados em suas estruturas de relacionamento. Por isso, temos que voltar a nos reunir, a criarmos horas de leitura coletiva, jogos coletivos, saraus de poesia, coding dojo para enfrentarmos problemas tecnológicos em conjunto… enfim, a dimensão digital não pode aprisionar a dimensão presencial. 

Nossos corpos são físicos, nossos afetos e nossos abraços são mais importantes do que cliques. Não podemos ficar refém de mediadores de IA e formatadores da nossa cognição. Muitos adolescentes não conseguem mais concentrar a atenção porque são prisioneiros do minuto, do nano conteúdo. Temos que conversar em todos os coletivos sobre o uso das redes e dos mecanismos de dependência e de controle das subjetividades que as Big Techs criaram”.

Ana Mielke – coordenadora-executiva do Intervozes 

Para que haja um efeito político considerável, seria preciso um movimento massivo de saída, o que aparentemente não está colocado neste momento. Sair da rede individualmente significa optar por um isolamento, ou seja, deixar de acompanhar o que acontece na vida de amigos ou mesmo no mundo, tendo em vista que estas plataformas possuem centralidade no debate público atualmente. Num contexto de disputa de ideias e opiniões, “estar fora” deste ambiente é deixar de dialogar com um contingente enorme de pessoas, organizações e movimentos, o que não parece estratégico neste momento. A saída, em massa ou coletiva, precisaria também considerar a criação de outras ferramentas para a manutenção deste diálogo público. Essas ferramentas não precisariam (e nem deveriam) estar baseadas no modelo de negócios e no designer que as plataformas privadas desenvolveram. Elas deveriam ser construídas a partir de outros parâmetros de sociabilidade digital, incluindo, a garantia de maior autonomia aos usuários do ponto de vista da gestão de seus próprios dados e maior liberdade em termos de interfaces de interoperatividade e navegabilidade.  

Por outro lado, é preciso levar em conta que além dos conteúdos violentos, discriminatórios, desinformativos, etc., a forma como estas redes retém nossa atenção e modulam nossos comportamentos impactam nossas subjetividades e as formas como nos relacionamos. E neste sentido, não descartaria as saídas individuais das plataformas digitais como medida importante para a garantia da saúde mental do usuário. 

A busca por plataformas é uma possibilidade, mas não faz muito sentido entrar em plataformas de modelos de negócios e designer semelhantes, que irão reproduzir os mesmos problemas: extração de dados, perfilamento de usuários, modulação de comportamentos. Precisamos pensar em novas possibilidades. Mas como abordado acima, não faz muito sentido a saída individual se ela for resultar em isolamento ou limitar a participação no debate público.

Uso estratégias individuais que passam pela delimitação do meu tempo de tela ou por educar o algoritmo para ele não recomendar de violências que busco combater. Exemplo: na busca por combater o racismo e a violência policial é comum que os algoritmos recomendem muitas violências desse tipo. Então busco não deter meu tempo em posts sobre o tema, nem mesmo clicar para assistir vídeos violentos, evitando assim, que o algoritmo me recomende estes conteúdos. Mas tais estratégias são individuais e limitadas.

 

Adriano Liziero – geógrafo, editor de conteúdo multiplataforma. Pesquisa inovação digital e tecnologias colaborativas e abertas. Cria conteúdo no @geopanoramas, onde utiliza a geotecnologia na comunicação sobre sustentabilidade e mudanças climáticas. 

Aprendi com o grande geógrafo brasileiro Milton Santos, na faculdade de Geografia da USP, a tomar as tecnologias hegemônicas, que servem aos interesses dos poderosos, como contrafinalidade. O movimento que faço nessas redes – e nos satélites que uso para capturar imagens do alto – são contrários ao que desejam os setores hegemônicos. Para isso, é preciso estudar o funcionamento dessas tecnologias, desafiá-las e subvertê-las em favor da solidariedade e do bem viver. Sou do tempo das redes abertas e livres, fui formado em coletivos de código aberto e pensamento hacker. Então, minha resposta não é voltada a simplesmente ESTAR nessas plataformas, mas em jogar o jogo delas para a construção de movimentos horizontais fora delas.

Tenho me voltado à força do lugar em contraponto às redes globais. Na escala local, podemos criar redes, inclusive digitais, mais interessantes às pessoas, pois as conversas são mais significativas e orgânicas; estão relacionadas ao espaço vivido. As pessoas sentem falta dos grupos, dos fóruns, onde o diálogo é horizontal. Redes locais precisam de menos dinheiro, menos servidores. No Geopanoramas, estou criando um projeto voltado a praças urbanas. As praças são o lugar do encontro, da formação de redes locais, além de serem tecnologias para a adaptação aos extremos climáticos. Em um mundo onde a maioria da população vive em cidades, sobretudo em metrópoles, as praças podem atuar como contrafinalidades e serem a inspiração para a emergência de redes digitais locais e horizontais, algo que as bigtechs não fazem porque não é tão lucrativo. Muita gente está em grupos do condomínio, do bairro, da cidade. Penso que o caminho é por aí, não o de criar mais redes verticais.

Criei um indexador para acompanhar apenas os conteúdos que me inspiram. Com isso, reduzi o uso do feed infinito, que adoece as pessoas. Porém, o que tenho feito cada vez mais é buscar esperança nos territórios, fora das telas. Tenho visitado praças, hortas comunitárias, agroflorestas e outras iniciativas de impacto positivo em busca de esperança. Em um ambiente tóxico, num mundo marcado pela perversidade, somos empurrados a olhar para os problemas sem vislumbrar as soluções, as contrafinalidades. Aprendi que a melhor ação para me proteger é estar em comunidade. No Geopanoramas, tenho um grupo que apoia o meu trabalho, inclusive financeiramente, no Apoia-se. São essas pessoas com quem posso contar na hora do aperto. A resposta é a comunidade e o lugar, em oposição ao que é imposto de longe, ao que busca homogeneizar o discurso.

 

Vitória Rodrigues – técnica em gerência em saúde, ativista pelo direito à cidade, estudante de comunicação social e comunicadora na Escola de Ativismo

Acho que faz sentido estar presente pelo sentido da disputa. Muito se fala que ao invés das redes, deveríamos estar mais nas ruas. Concordo. Acontece que até mesmo as ruas seguem uma lógica de produção de consumo, de priorização de máquinas, de geração de insegurança. Todo espaço na sociedade capitalista é projetado para o controle, então nos cabe reinventar o uso do que existe, inclusive das plataformas de mídias sociais.

Não faz sentido ficar dando, de graça, informações sobre a minha vida para o Musk, o Zuckerberg e o Page. Tudo que eu voluntariamente ofereço e consumo é revertido em uma grana que não chega ao meu bolso. Tenho usado o Mastodon e o Pixelfed regularmente, porque querendo ou não, muita gente tem o hábito de publicar textos e fotos pessoais. E eu prefiro fazer a maior parte disso numa rede social descentralizada, por mais que poucas pessoas que conheço usem.

Eu uso as redes sociais para mobilizar protestos, ativismos, denúncias. Entro nas contas que administro só uma vez ao dia. Sempre que me vejo assistindo mais de cinco reels numa sequência, lembro que não vou lembrar da maioria deles. E aí penso que devo direcionar o meu tempo a mim. Por isso, também, tenho usado as redes do Fediverso e navegadores como o Duckduckgo. Tudo é um rastro… a gente sempre acaba deixando, mas é melhor deixar de menos, né?.

Joelson Marworno – Ativista indígena em comunicação e segurança digital e coordenador de comunicações da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN)  

Não faz sentindo continuar usando essas plataformas, porque isso disponibiliza informações e dados analíticos para que sejam usados como estratégia contra pautas contrárias a eles. Uma vez que eles possuem o domínio da informação eles ficam cada vez mais poderosos para manipular os interesses a favor dos grandes capitalistas, e assim a desigualdades sociais só aumentam.

É fundamental que migremos para App de código aberto com funcionalidades e UX Designer idênticos para que assim sejam mais acessíveis ao aprendizado do uso do sistema por sua vez aumentando número de usuários e acessos às nossas causas e ideias sem a manipulação do algoritmo de entrega e coleta de informação uma vez que os códigos são abertos e auditáveis.

Utilizo configurações de privacidade bloqueando  os periféricos que coletam informações, porém como trabalho com comunicação fica muito difícil não se atentar as redes sociais e acabo que sendo pescado no algoritmos das redes.

Nirvana Lima – jornalista e Educadora Popular em Cuidados Digitais da Escola de Ativismo

No mundo ideal, todas as pessoas já estariam migrando para redes sociais que priorizam o controle e a privacidade dos usuários. No entanto, não acredito que a solução esteja em uma saída imediata das plataformas mainstream. Há um tom paradoxal na minha fala, porém abandonar esses espaços sem estratégia significa abdicar da possibilidade de disputar narrativas e impactar quem ainda está lá. As redes sociais que compõem o monopólio de Zuckerberg retêm a atenção de bilhões de pessoas, sendo milhões apenas no Brasil. Segundo dados do DataReportal, mais de 134 milhões de brasileiros estão no Instagram, o que equivale a aproximadamente 62% da população do país – e isso considerando apenas uma única plataforma.

É ingênuo pensar que conseguiremos desmantelar a estrutura e seus algoritmos de dentro para fora, mas mensagens adversas ao sistema nesses territórios digitais tencionam discursos e podem criar fissuras em uma arena de sentidos altamente controlada. Trata-se de uma disputa desigual, permeada por regras opacas e dinâmicas de silenciamento em um espaço que ainda permite que vozes dissonantes sejam amplificadas. Permanecer nesse campo minado exige, no entanto, uma postura metodológica: compreender as lógicas que regem essas plataformas, exigir sua regulação, saber explorar brechas e, ao mesmo tempo, construir rotas de saída.

Em uma sociedade neoliberal, o valor do interesse é medido pelo consumo. Quanto mais pessoas aderirem a plataformas colaborativas, comunitárias e de código aberto – que garantam maior controle sobre dados, privacidade e transparência algorítmica –, maior será a pressão sobre o mercado para seguir essa direção.

Raimundo Quilombola – Jovem do Quilombo Rampa, no Maranhão. Comunicador ancestral e cofundador da Rádio e TV Quilombo, formado em Geografia e Mestrando em Estudos Africanos e Afro Brasileiros.

Para mim está cada dia fazendo menos sentido ficar em redes sociais que, ao invés de contribuir com a nossa luta estão mais focadas nesse distanciamento das pautas da gente, principalmente de movimentos sociais e comunidade tradicionais. E se entrelaçando cada dia mais com a abertura desses discurso de ódio. Então é algo que eu já tenho refletido muito. Eu me vejo menos trilhando esse caminho, de estar intensamente dentro dessas plataformas.

Eu acho que chegou o momento que é muito importante, da gente estar pensando e traçando outras metas de nos auto fortalecer com outras redes; Eu acho que é o caminho mais certo até o momento, o que é visível para a gente não continuar se frustrando tanto de não ver os algoritmos recebendo as nossas pautas, que são pautas urgentes e necessárias, porque são pautas que dizem respeito aos direitos de quem mais precisa né? A proteção da vida dessas pessoas… então a gente a todo momento está falando de bem viver, de vida, de pessoas que que precisam a todo momento está pautando nesse espaço, e fica essa angústia de que tudo isso não faz muito sentido mais dentro dessas redes né? Nunca fez, né? Mas agora muito menos. Acho que chegou o momento da gente estar pensando em outras plataformas. Faz muito sentido a gente buscar fugir desses algoritmos que só envenenam a gente.

Temos que começar a trazer esse tema com mais força, sobre o tempo que os nossos ativistas estão passando nas redes sociais. A gente acaba jogando muito da nossa energia nesse espaço, acreditando que ele vai ser um espaço saudável e muitas vezes a gente vê o contrário. Às vezes a gente prepara memórias, histórias, arquivos de áudio de vídeos que a gente quer que chegue em muitos outros lugares, em muitos outros movimentos e que ganhe as telas de uma forma que todo mundo entenda o que está acontecendo, principalmente no contexto de violação de direitos das comunidades, e tudo isso acaba tendo movimento contrário. E essa navegação, ela não tem sido muito saudável. Acho que essa questão de diminuição do tempo de tela e de ter novas estratégias de proteção é importante, porque isso leva a muitas coisas, né? Inclusive problemas psicológicos.

Pedro Telles – diretor do Democracy Hub (D-Hub) e professor da Fundação Getúlio Vargas  (FGV)

A síntese da resposta para mim é, depende da sua estratégia. Se o seu objetivo é disputar a opinião pública em grande escala, essas plataformas, especialmente as da Meta, mais do que as do Elon Musk né, do X, nesse momento ainda são onde a maioria das pessoas está. E apesar de ser um jogo desnivelado nessas plataformas, eu acho que ainda é espaço onde o jogo é jogado e onde existe a possibilidade de fazer uma disputa de opinião em desvantagem, mas que ainda é relevante. Então, se você faz disputa de opinião em grande escala, eu acho que faz sentido você estar especialmente nas da Meta. O X está cada vez mais virando um lugar onde só tem extremista frequentando de verdade e aí cada vez faz menos sentido porque o público que está ali não tem muito mais chance de ser convencido. Agora se a Meta avançar mais numa direção e se tornar igual ao X, vai fazer menos sentido estar ali. Mas existem outras duas dimensões. 

Precisamos também fortalecer alternativas como o BlueSky, que tem se mostrado interessante, e considerar que tipo de trabalho faremos nas redes sociais e fora delas. Se o foco é organizar ativistas e voluntários, podemos usar plataformas menos vulneráveis à Big Techs.

Existem alguns esforços também interessantes como aquela campanha que está sendo puxada pelo pessoal ligado à Mozilla Foundation, ligado ao Wikipédia entre outros, de captação de recurso para ajudar a financiar a infraestrutura que está por trás do BlueSky e de outras redes que estão surgindo mais saudáveis e garantir mais uma possibilidade para esse ecossistema de de movimento de organizações e redes que querem construir alternativas.

É necessário focar na regulação econômica das Big Techs, como a Meta, para combater seu poder de monopólio e abuso de poder econômico. Isso inclui forçar a interoperabilidade entre plataformas, como a existente no email, e garantir transparência algorítmica. Você não consegue fazer isso hoje porque essas empresas não deixam, só que isso não é tecnicamente impossível. E a regulação econômica passa por esse tipo de coisa, por forçar a interoperabilidade, por forçar transparência algorítmica e entre outras coisas que precisam ser feitas, que é importante que a gente trabalhe pra fazer acontecer.

São muitos os possíveis tipos de problemas e ameaças que a gente encara nas redes sociais. Vai desde lugar de vício em telas, de como essas como celulares e redes sociais são projetadas para nos manter viciados. E aí pra lidar com esse tipo de coisa, tem várias medidas, como aplicativos que bloqueiam, colocam limites de tempo e até troca de celular. Eu troquei meu celular faz quase um ano para reduzir tempo de tela, por um celular que me força a isso. Então se é esse tipo de problema, de exposição excessiva a conteúdos problemáticos ou a vício, tem toda uma série de recomendações aí. Mas tem outro tipo de risco. 

É muito comum ativistas de temas ligados a gênero ou a raça sofrerem ataques misóginos e racistas online. Ativistas do tema de combate de informação e democracia sofrerem ameaças pelo trabalho que fazem buscando expor perfis e conteúdos extremistas. Então se o risco é na linha de ameaças à sua integridade digital, psicológica ou física, aí tem medidas de treinamentos de como é que você não expõe informações sensíveis online, de como é que você identifica se uma ameaça é mais grave que outras. Acho que os cuidados dependem um pouco dos tipos de proteção que a gente tá falando e dos tipos de riscos.

Leia também: As redes sociais se alinham com a extrema-direita: o que isso significa para a democracia?

TEXTO

Letícia Queiroz

jornalista quilombola, repórter da Escola de Ativismo

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