Por Sara Herschander, para o Waging Nonviolence
Após um mês de manifestações lideradas por professores, o governo anunciou medidas de controle de preços que ajudaram a mediar uma paz frágil no país
Centrais sindicais se juntaram aos protestos para demandar medidas anti-desigualdade e contra a inflação l Foto: People’s Dispatch
Os professores panamenhos voltaram à sala de aula no começo de agosto depois de uma greve de um mês que impulsionou as maiores manifestações de massa do país desde a queda do ditador Manuel Antonio Noriega em 1989.
Embora a intensidade dos protestos pelo país tenha diminuído desde que o governo do presidente Laurentino “Nito” Cortizo anunciou uma série de medidas de controle de preços em julho, as tensões permanecem altas durante as negociações entre grupos da sociedade civil e o governo. As tratativas buscam planos para enfrentar questões arraigadas na sociedade, como desigualdade, corrupção e o alto custo de vida.
“As pessoas estão nas ruas e estão cansadas de estarem com os bolsos vazios”, disse Luis Arturo Sánchez, secretário geral da associação de professores da província de Veraguas, antes de declarar uma greve por tempo indeterminado em 4 de julho.
Ele vocalizou a insatisfação de trabalhadores da construção civil, grupos indígenas e da maioria da sociedade panamenha, que estão frustrados com o aumento do preço de bens básicos como alimentos e gasolina. A frustração se transformou em unidade e eles se juntaram aos professores em manifestações por todo o país. Os ativistas ergueram barreiras em algumas das principais estradas do país, incluindo a Rodovia Pan-Americana, causando enormes bloqueios no trânsito e escassez de combustível e alimentos.
Manifestantes no Panamá também expressaram indignação por causa de um vídeo viral que mostrava legisladores do Partido Revolucionário Democrático celebrando o início da legislatura com garrafas de uísque de US$340.
“Servem-se de suas bebidas e esperam que o povo não repare”, cantavam nas ruas.
Em um esforço para acalmar a agitação, o governo negociou uma série de medidas de controle de preços com os sindicatos do país. As medidas congelaram o preço da gasolina a US$ 3,25 por galão e objetivavam também reduzir o custo de uma cesta básica de alimentos em 30%.
No entanto, o descontentamento popular é mais profundo do que aquele que vem da raiva em relação à crescente taxa de inflação no país dolarizado, que acelerou para 5,2% em junho. Apesar de alta, a taxa é pequena em comparação com a inflação global em lugares como Sri Lanka e Argentina, onde o alto custo de vida também provocou protestos nos últimos meses.
“No Panamá, por trás de cada decisão técnica, há uma decisão política para favorecer aqueles que mais ganham”, disse o economista Maribel Gordon no primeiro dia de negociações. “O nível de evasão ao imposto de renda é superior a 64%. E essa cobrança recai então sobre os trabalhadores”.
Embora o Panamá seja um dos países mais ricos da América Latina, ele tem um dos mais altos índices de desigualdade da região. Mais de um em cada cinco panamenhos vive na pobreza – e o desemprego no país está em quase 10%. A corrupção também está alta: o Panamá ocupa o 105º lugar de 180 países no Índice de Percepção da Corrupção.
Por enquanto, a Igreja Católica tem mediado as negociações entre funcionários do governo e grupos da sociedade civil, que delinearam oito prioridades para a reforma, incluindo medidas para mitigar o alto custo dos bens, financiamento da educação e transparência governamental.
“Precisamos nos congratular por termos demonstrado mais uma vez que o diálogo é o caminho para encontrar soluções”, disse José Domingo Ulloa Mendieta, arcebispo do Panamá. “Juntos, restabelecemos a paz social”.
No entanto, mesmo quando os protestos recuaram, as rodovias reabriram e os professores voltaram à sala de aula, analistas como Carlos Barsallo — ex-presidente do capítulo panamenho da Transparência Internacional — expressaram ceticismo quanto ao potencial de mudança real.
Em entrevista à EFE, Barsallo disse que imagina que as negociações irão “apagar o fogo temporariamente” e que a crise provavelmente “se repetirá se os problemas mais profundos não forem resolvidos”.
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Sara Herschander é uma jornalista freelancer e produtora de áudio baseada em Nova York. Tem trabalhos publicados em The American Prospect, Documented NY, e Univision, entre outras publicações.
(Publicado originalmente em 5 de agosto de 2022 no site Waging NonViolence)