Por Luiza Ferreira – 05/02/2024
As juventudes, que pouco contribuíram para a crise climática, serão as mais afetadas por ela, ao mesmo tempo em que são colocadas num lugar de “salvadoras”. Como elas se sentem diante de tudo isso?
Crédito: Marcio Isensee e Sá via O Eco
Thalia Oliveira, uma ativista climática e socioambiental paraense, teve que entender muito cedo o que era o racismo ambiental. “Desde os 14 anos tive que buscar entender o contexto no qual eu estava inserida nessa enorme escala de desigualdade que tanto falamos, vivendo em um território cercado por garimpo ilegal, desigualdade social, falta de acesso às coisas mais básicas como água e saneamento básico”. Diante desse cenário, o fazer ativista – participar de organizações, coletivos, conselhos, ir para as ruas, se mobilizar – surge como uma necessidade vital.
Ela hoje é Coordenadora do GT Político da Articulação pelo Conselho Nacional de Juventudes pela Ação Climática e Meio Ambiente (Conjuclima) e pensa que ”fazer parte desse conselho é ir um passo mais longe no desejo que temos de mudar o cenário atual do Brasil, é uma forma organizada de trazer esse debate para o território nacional de forma urgente”.
Segundo dados do Atlas das Juventudes, a juventude representa hoje ¼ da população brasileira. São quase 50 milhões de pessoas com idade entre 15 e 29 anos. A maioria é ainda constituída por jovens negros: 61% pardos, 10% pretos, 38% brancos, 0,5% amarelos e 0,4% indígenas, como revelam dados do IBGE (2020).
E essa parcela da população têm se esforçado para ser ouvida. Em 2022, jovens ativistas entregaram a Carta das Juventudes pelo Clima ao presidente Lula em novembro de 2022, pontuando que a “exclusão das Juventudes da gestão governamental impacta em como elas estarão representadas, nas políticas públicas que serão implementadas, na cidadania, na participação social e no próprio direito à existência”.
“O público jovem, considerado como uma das parcelas da população mais afetadas pela pobreza, desigualdade, desemprego e mudanças climáticas, já sofre com estes impactos em seu presente. Essa realidade se agrava ainda mais quando consideramos recortes de gênero, cor e território, evidenciando o racismo ambiental e estrutural vigentes”, disseram.
Em abril de 2023, o Em Movimento, em parceria com o Engajamundo e outras organizações lançaram a pesquisa Juventudes, Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (JUMA), realizada em 2022, que avalia que 90% dos jovens brasileiros se importam com a pauta do meio ambiente.
Outro dado relevante da pesquisa: 8 em cada 10 jovens concordam que as mudanças climáticas estão afetando a sua qualidade de vida, identificando que vivemos uma crise do clima. Quando observaram os jovens inseridos em contextos de periferia ou favelas, 7 em cada 10 revelaram a crença na relação da pauta do meio ambiente com o território onde vivem.
Mesmo com o alto índice de reconhecimento das problemáticas das mudanças climáticas, os articuladores do Conselho Nacional de Juventudes pela Ação Climática e Meio Ambiente chamam atenção para algo em particular:
“O que a pesquisa mostrou é que, quando pensam em mudanças climáticas, muitos desses jovens associam com conceitos como o derretimento de geleiras, que está totalmente desvinculado do que é a realidade brasileira. Conceitos como racismo ambiental, justiça climática e Agenda 2030 são pouco conhecidos e não chegam para a maioria dessa população jovem”, comentam.
Para Frances Andrade, ativista socioambiental do Alto Sertão Sergipano e atual Diretor Executivo da Associação de Jovens Engajamundo, as juventudes têm um papel fundamental na solução dos problemas atuais. Ele também fez parte, ao lado de outros jovens, da idealização do Conselho de Juventudes pelo Clima.
“É importante não romantizar esse espaço e essa luta [o Conselho]. É incrível conhecer jovens ativistas das mais diversas regiões e territórios. Mas estamos aqui reunidos em prol de algo que diretamente afeta nossa existência e bem estar no planeta, ou seja, não é um motivo de alegria”, diz Frances.
Na visão do socioambientalista, o ativismo climático é uma luta necessária e ao mesmo tempo desgastante para as juventudes brasileiras, que convivem com uma realidade e uma projeção de futuro nada agradável. Para muitos recortes de juventudes negras, periféricas, LGBTQIAP+, mulheres e de comunidades tradicionais e originárias, o sofrimento é cotidiano em seus territórios já afetados pela crise climática, além de terem seus direitos constantemente violados.
“Aos poucos estamos moldando o mundo do nosso jeitinho, para que futuramente e no nosso presente, a realidade seja apenas desfrutar de um planeta sadio e sem crise climática acelerada pela ação humana”, acrescenta.
Ele acredita fortemente no entendimento da luta ativista enquanto uma luta coletiva, e quando perguntado sobre o que espera para o futuro dessas juventudes, ele traduz um desejo de muitos:
“Eu espero que os jovens sejam apenas jovens, obviamente politizados e engajados em suas causas. Mas simplesmente, exercendo seu direito de ser jovem sem precisar lutar por sua existência. Porém, enquanto isso, estaremos aqui lutando para que isso aconteça”, finaliza.