2023 é quase 2003.
Acordei neste 1 de janeiro de 2023, com a sensação de já ter vivido este dia.
Como pode?
Comecei a escavar essa sensação. Talvez por estar aqui na casa da minha mãe, no quarto de cama estreita onde passei boa parte da vida. Talvez por sentir o cheio do café que minha mãe sempre faz antes que eu acorde, não importa o horário, eu acordo e ela está sempre lá com a mesa posta.
Talvez por estar na companhia dos meus livros, dos meus discos, dos meus diários… das coisas e das lembranças que me fizeram.
Não era só isso.
E como uma clarão na memória, me veio o dia 1 de janeiro de 2003.
Tinha acabado de fazer 19 anos, terminei o magistério, formatura, votado pela segunda vez na vida e desta vez em uma eleição presidencial. Eu tinha também meu primeiro emprego.
Na Rádio metropolitana AM 1100, experimentava viver uma vida de “jornalista”.
Infelizmente o locutor e dono da rádio não gostava muito dos meus textos. E não dava muita bola para lê-los durante a programação, era ainda uma aprendiz e naturalmente a rádio tinha muita gente boa e experiente como colunista.
Mas naquele dia 01 de janeiro foi diferente.
O meu pai costumava me levar até a rádio para me ajudar a abrir tudo para o programa que entrava no ar as 4h da manhã. E neste horário a rua ainda estava bem vazia.
Ele tinha o hábito de me deixar lá e voltar escutando a programação para conferir que havíamos preparado, as musicas, as simpatias de ano novo, as dicas de lazer… Ele ficava atento pra ver se algum dia os locutores finalmente leriam meus textos, para além de mais um dia ficar somente ali nos atendimentos ao telefone e na mesa de som.
Meu pai me deixou na rádio, sem saber direito se eu tinha um texto para aquele dia.
E se tinha, qual seria o tema?
Ano Novo vida nova. Esperança de melhores dias. Saúde e paz para a cidade de Mogi das Cruzes e região?
Nada disso.
Naquele dia o texto tinha o titulo “Bandeira vermelha na mão, sorriso branco na cara” e falava sobre o clima da posse do Presidente Lula. E para minha surpresa…
O locutor principal abriu a programação dizendo assim:
“Muito bom dia queridos ouvintes! Feliz ano novo… blá blá blá…
Hoje é um dia especial, pois temos um novo presidente, um presidente do povo, metalúrgico, não é Luciana?
Metalúrgico como o seu pai certo?
A Luciana está aqui nos ajudando com a mesa de som e no atendimento ao telefone que você conhece, e ela escreveu um texto muito especial, que eu vou ler aqui para vocês!”
E aí, foi!
Eu comecei a chorar muito! Fiquei emocionada porque ali naquele texto eu buscava descrever como seria posse do Lula.
As pessoas de bandeira em punho lá em Brasília, muita muita muita gente na rua…
O sorriso no rosto e a confiança de que o governo seria tudo o que a gente queria, o que a gente sonhava. As pessoas se abraçando e cantando as musicas da campanha, o povo tomando conta, ocupando o espaço todo do gramadão.
Imaginava a gente assistindo a posse pela TV muito feliz, pois o meu pai, e meus tios eram companheiros lá do ABC.
A alegria dominava a sala de casa!
Mas a gente também sentia medo.
Será que o Lula vai subir mesmo a rampa? Será que vão matar o Lula? Será que vai ter alguma pataquada?
É minha gente, não era 2023 não… era 2003 mesmo. E isso passava muito por nós.
O meu pai imediatamente depois da leitura do texto, me ligou lá no telefone da rádio:
“Lu, o cara leu o seu texto hein! Parabéns para você e para o Lula!”
Pô e quem era eu né?
O Lula era o Presidente!!!!!! rs…
Mas pro meu pai, eu tinha marcado um gol, e era um gol na copa que o Lula tinha ganhado e tava levantando a taça!!!
Esse dia aí foi bonito demais.
São 20 anos, e nem parece, porque tá tudo igual, mas tá tudo diferente.
Eu, fiz duas universidades, mestrado, doutorado tudo com apoio do governo Lula.
Abandonei a carreira no rádio e me tornei educadora apaixonada…
Nunca deixei de escrever.
Lula esteve presidente por dois mandatos.
Ajudou a eleger Dilma! Primeira mulher presidenta do Brasil, e que mulher!
Em 2013 meu pai faleceu… ô ano complicado tem gente estudando até hoje!
De lá pra cá, foi tristeza a luta.
A Dilma caiu…
O Lula foi preso e o povo não queria deixar! Eu tava lá!
Vi o que parecia ser o fim do PT.
Vi o Brasil eleger um fascista, nojento.
Chorei
Chorei
Chorei
E aqui estamos de pé.
Derrotamos a mediocridade, os inimigos do Brasil, de mãos limpas, olho no olho, na campanha, no voto do povo pobre.
Me lembro do discurso do Lula em 2003:
“O Brasil conheceu a riqueza dos engenhos, das plantações de cana de açúcar, mas não venceu a fome.
Proclamou a independência, aboliu a escravidão mas não venceu a fome.
Conheceu as riquezas das jazidas de ouros em Minas Gerais e da produção de café no vale do Paraíba, mas não venceu a fome”
Se Lula quiser, pode repetir esse discurso nesta posse sem nenhum problema, pois nesses últimos quatro anos voltamos a este Brasil.
Mas o Lula não é o mesmo. O Brasil também não é o mesmo.
Nós também não somos as mesmas, mas seguimos de “Bandeira vermelha na mão e sorriso branco na cara”!
Escrevo nesta manhã acreditando, que é possível que tudo esteja acontecendo novamente, só que muito melhor, pois aprendemos muito de lá pra cá… pois estamos com calos vivos nas mãos.
E prontas para reconstruir tudo!
2023 será ainda melhor do que 2003.