Aulas perdidas, momentos interrompidos, notas tristes. O início do meu ensino médio na Escola Politécnica da Fundação Oswaldo Cruz, localizada em Manguinhos, zona norte da cidade do Rio de Janeiro, foi um tanto conturbado. Imaginei, de início, que por ser uma escola federal difícil de ser admitida, problemas externos também não chegariam até lá tão facilmente. A tola Vitória de 14 anos de idade estava completamente enganada, isso por dois motivos: (1) acreditei que pela escola ter uma infraestrutura excelente, a violência não seria uma questão; (2) pensei que os problemas lá de fora não fossem uma questão por passar o dia inteiro lá, de 8h às 17h.
O triste dessa história é que não rolou apenas uma ou duas, mas várias vezes das minhas aulas serem interrompidas por conta de operações policiais contra o tráfico de drogas da região. A coisa é que 2019 não foi nem o pior ano de interrupções de aulas lá na escola, mas o choque foi grande, já que foi o ano que entrei. Logo no meu primeiro dia, durante a Semana dos Calouros, a gente teve que ficar no auditório para além do esperado para ninguém acabar ferido por bala. Ao menos duas vezes um ônibus da Fundação levou eu e meus colegas para a estação de trem mais próxima, visto que a gente não poderia pegar o trem em Manguinhos. Isso porque, além do ramal Gramacho ter as suas operações paralisadas, a estação é elevada e toda aberta. Até julho, Manguinhos foi a parada que mais sofreu com tiroteios, contando com 18 paralisações.
Naquele ano, segundo o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, 74% das escolas públicas da rede municipal de educação do Rio de Janeiro tiveram ao menos um tiroteio em seu entorno, todos estes com o envolvimento de agentes de segurança pública. Estava tudo muito difícil e eu sentia que pouco poderia mudar, só que vi um bonitão (um alô para o Tiago Lopes Marques caso ele esteja lendo isso) da minha escola, em pleno segundo ano do ensino médio, fazer um Projeto de Lei (PL) que definia requisitos básicos para que alguém assumisse o cargo de gestor de uma unidade do Sistema Único de Saúde. Aquilo fez muito sentido pra mim, ainda mais se tratando de alunos do curso técnico de Gerência em Saúde, uma área tão necessária, mas tão desvalorizada.
Sabendo daquilo, eu resolvi que era hora de eu também tentar fazer um projeto e, como o Tiago, ser deputada jovem. O Parlamento Jovem Brasileiro (PJB) seleciona jovens de todo o Brasil, de escolas públicas e privadas, para vivenciar uma jornada parlamentar de uma semana. Tudo o que precisava para passar era redigir um Projeto de Lei e fazer ele ser bom ao ponto de representar o meu estado lá. Demorou um tempo pra me tocar, mas percebi que a violência não poderia continuar daquele jeito. Por isso, procurei meus professores do ensino técnico de Direito Administrativo e Legislação, e até mesmo uma galera do Ministério Público e do Fundo das Nações Unidas para a Infância. Essa procura também me levou a ser ativista.
Foi assim que eu me tornei parlamentar jovem. Cinco meses antes do processo seletivo ser aberto, o meu Programa de Redução dos Impactos da Violência Urbana nas Escolas já estava rolando e foi selecionado. Por conta da Covid-19, não viajei, mas fui selecionada por algo que escrevi. A ideia era trabalhar o socioemocional de jovens que, como eu, fossem afetados pela violência urbana ao redor das nossas escolas. Hoje em dia, com toda a certeza, eu não acho que essa seja a solução porque trata a consequência e não a causa. Por causa disso tudo, quero falar do que aprendi até agora e porque isso é importante para se firmar enquanto ativista.
O que deve-se levar em consideração ao fazer um projeto de lei federal, afinal?